O ex-funcionário continua destilando palavras de ódio contra a empresa
meses após ser demitido. O filho fica sem ação ao receber a notícia da
morte da mãe. O namorado traído não consegue se envolver em um novo
relacionamento. Todas essas situações fictícias envolvem experiências de
perdas. E quem passa por algo parecido vivencia exatamente o mesmo
processo psicológico: a vivência do luto.
O luto, ao contrário
do que se imagina, não faz referência apenas à reação que se tem diante
da morte de alguém querido. "O luto é um processo relacionado a todas
as perdas significativas que sofremos", diz a psicóloga Elaine Gomes dos
Reis Alves, professora e pesquisadora do Laboratório de Estudos Sobre a
Morte, do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo).
Ela explica que essas privações podem ocorrer tanto no plano concreto
–quando ocorre a perda de um emprego, por exemplo– quanto no simbólico
–quando "morre" a figura idealizada da namorada.
Segundo Gabriela Casellato, psicóloga pela PUC (Pontifícia Universidade
Católica) de São Paulo e cofundadora do Instituto de Psicologia 4
Estações, instituição particular na capital paulista, o luto se
apresenta como um conjunto de reações associadas à perda.
"Na esfera física, podem surgir fadiga, queda de resistência imunológica e alterações de sono, alimentação, atenção e concentração. As alterações emocionais incluem tristeza, angústia, ansiedade, raiva, medo e insegurança. Também pode ocorrer isolamento social ou, ao contrário, a necessidade de falar continuamente sobre a perda. Há, ainda, pessoas que têm a fé abalada nessas situações, que perdem a esperança e questionam valores antes arraigados", diz Gabriela.
"Na esfera física, podem surgir fadiga, queda de resistência imunológica e alterações de sono, alimentação, atenção e concentração. As alterações emocionais incluem tristeza, angústia, ansiedade, raiva, medo e insegurança. Também pode ocorrer isolamento social ou, ao contrário, a necessidade de falar continuamente sobre a perda. Há, ainda, pessoas que têm a fé abalada nessas situações, que perdem a esperança e questionam valores antes arraigados", diz Gabriela.
De
fato, cada pessoa pode reagir de maneira diferente a uma perda que, para
ela, tenha um valor importante. Mas, na década de 1960, uma psicóloga
suíça chamada Elisabeth Kübler-Ross (1926-2004) descreveu cinco fases
que, de maneira geral, compõem o processo do luto:
- Negação:
a pessoa tenta negar a existência do problema ou situação e, às vezes,
evita até falar sobre o assunto. "Isso não pode ser verdade!", pensa.
- Raiva: é comum aparecer revolta e ressentimento quando a pessoa se dá conta da perda. "Por que eu?" é o pensamento recorrente.
- Negociação: quando a hipótese da perda começa a se concretizar, é comum que a pessoa tente reverter a situação tentando um acordo consigo, com outra pessoa ou divindade.
- Depressão: ocorre quando a pessoa toma consciência de que a perda é inevitável. Tristeza, desolação, apatia e medo são sentimentos comuns nessa fase. Não deve ser confundida com a doença diagnosticada como depressão, que envolve um desequilíbrio químico e tratamento específico. Por isso, a psicóloga Elaine prefere usar o termo "tristeza".
- Aceitação: é a fase em que pessoa aprende a viver sem aquilo que perdeu. Não significa esquecer ou não sentir mais tristeza ao se lembrar do fato. "Um pai nunca vai aceitar a morte de um filho", exemplifica a psicóloga Elaine. Nesse contexto, aceitar é apenas conseguir continuar tocando a vida.
Elaine Alves explica que essas fases não
devem ser vistas como obrigatórias e também não seguem necessariamente
uma sequência. Podem, inclusive, se sobrepor umas às outras. A fase
descrita como depressão está, com maior ou menor ênfase, presente em
todas as outras. "O processo é sofrido, mas necessário para a superação
da perda. A tristeza precisa ser vivenciada. O problema, hoje, é que
toda tristeza é tratada como depressão", diz ela.
Você não tem que ser forte
Perdeu um filho? "Você tem que ser forte!" Está sofrendo por um amor? "Isso vai passar". Perdeu o emprego? "Foi melhor para você". Levaram o carro em um assalto? "Não fique assim, o importante é que você está com saúde".
Apesar de estarem sempre carregadas de boas intenções, essas tentativas
de consolar alguém que sofre uma perda quase nunca funcionam, segundo
Elaine. Ao contrário. A tentativa de amenizar o sofrimento do outro pode
até prejudicar o processo de luto dele. "É muito ruim quando a pessoa
se sente desvalorizada em sua dor. Os pequenos lamentos também precisam
ser acolhidos", diz a psicóloga.
Nesse
momento, ajudar é reconhecer o direito de quem sofre a ser fraco e expor
sua dor ou, ao contrário, o direito a silenciá-la. Assim, tão
prejudicial quanto inibir o sofrimento pode ser a insistência para que a
pessoa que está triste chore. "Quem não consegue chorar sofrerá, além
da dor da perda, a culpa por não reagir da maneira esperada", alerta
Gabriela Casellato. E em boa parte das vezes, o melhor consolo é o
silêncio. "Os judeus, por exemplo, têm o costume de se revezar para
ficar em silêncio ao lado da pessoa enlutada", diz Elaine.
Quando procurar um especialista
A psicóloga Elaine diz que as pessoas mais resilientes tendem a reagir melhor ao luto. "Elas geralmente enfrentam melhor as situações de perda", afirma. O conceito de resiliência, emprestado da física, é utilizado para definir essas pessoas que lidam bem com situações adversas.
Para a psicóloga Rosane Rodrigues, professora do Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae, instituição que oferece cursos para profissionais e atendimento psicológico, de São Paulo, o amadurecimento –não necessariamente ligado à idade– também pode influenciar positivamente na maneira como a pessoa lida com o luto. "O enfrentamento da morte e das perdas vai ficando menos difícil a cada vez que passamos por essas situações", afirma.
O
processo de elaboração do luto pode ser longo: não há tempo definido
para terminar. Mas as especialistas identificam que o período de um ano
costuma ser o mais crítico. É quando diferentes marcos temporais
lembrarão a perda sofrida, como o aniversário da pessoa que morreu, o
primeiro Natal em situação adversa ou a época de confraternização de
final de ano da empresa em que se trabalhou durante tanto tempo.
Passados esses meses, é esperado que a pessoa já saiba como é viver e
sobreviver à nova realidade e que, aos poucos, consiga ir retomando a
sua vida.
Pode ocorrer, no entanto, que
pessoas com condição ou histórico prévio de depressão tenham a doença
desencadeada ou agravada numa situação de luto. Segundo a psicóloga
Gabriela Casellato, três aspectos podem pesar nesse diagnóstico: o tempo
do luto, a intensidade das reações e o impacto que elas têm sobre a
vida da pessoa. Vale avaliar, por exemplo, até que ponto a tristeza está
impedindo quem sofre de desempenhar as atividades que antigamente
faziam parte da rotina, afetando os relacionamentos com outros parentes e
amigos ou colegas de trabalho.
FONTE: UOL Mulher